Teatro lotado e ansiedade para assistir Quase Normal, que teve ontem estreia para convidados no Teatro Clara Nunes. Graças à uma promoção do Mr. Zieg fui contemplado com um par de ingressos para este dia.
Eu não tinha muita intimidade com Next to Normal. Tratei de procurar alguns vídeos e ouvir a trilha sonora da montagem original. Fiquei apaixonado. Uma composição genial.
O espetáculo é uma necessidade pública. Toca o assunto dos conflitos da psique humana, que doem na alma e que podem levar à loucura. Loucura. A linha tênue que podemos ultrapassar por qualquer descuido com a gente mesmo. Diana Goodman vive esse conflito. Sofre esse distúrbio.
Eu tenho depressão. Estar face a face com aquela mulher, com a sua família, com os seus dilemas e seus desejos trouxe, inevitavelmente, reflexos de minha própria vida. A depressão (e talvez a loucura) é a negação do aqui. O pânico do agora. O presente dói. Então se refugia no passado, num hedonismo do que virá ou em delírios.
Mas o espetáculo nos toca sem machucar. A montagem distancia o suficiente para não entrarmos na onda de Diana. Ela não é a única ali. Há o seu marido, Daniel, como um equilibrista de pratos, usando dos métodos que lhe convém para manter algum tipo de paz. A filha, Natalie, ferida, artista (a arte é um refúgio, não?), buscando o seu próprio espaço num mundo de renegações. Henry, um alívio, uma luz, para Natalie, e para o público. E Gabriel. O filho preferido, primogênito, um anjo, mas da vida ou da morte? Há ainda os psiquiatras de Diana representando a medicina, a psicologia e a indústria farmacêutica.
As versões em português de Tadeu Aguiar variam. Há momentos em que não há métrica e percebe-se uma tentativa de manter a ideia original da letra em inglês. Mas a grande parte das versões está bem adaptada e criativa, mantendo o sumo da canção. Tadeu Aguiar também dirigiu e consegue manter um belo trabalho de atores, mas talvez ainda não tenha o ritmo certo da encenação. Acredito que em poucas performances isso se acerte e veremos o palco em chamas!
Ah, os atores. Vanessa Gerbelli merece todos os aplausos. Um trabalho belíssimo. Ela domina a montanha-russa de emoções que é a sua personagem. E canta com todas as sutilezas que uma pessoa bipolar emprega às palavras. Há dor, há sonho, há explosão, há afago. Cristiano Gualda emociona com o seu marido devotado mas hesitante, que não enfrentou os próprios demônios mas espera tirar a esposa de seu inferno pessoal. Eu só o tinha assistido em Beatles e em Oui oui, e fiquei muito feliz de vê-lo nesta peça de alto teor dramático. Bravo!
Olavo Cavalheiro com uma voz e um olhar penetrantes. Não sei quantos anos ele tem, mas tenho certeza de que terá uma carreira longa e brilhante. Carolina Futuro personaliza a carência de todos os personagens mas ainda tem esperança, pelo menos no próprio destino. Sua Natalie por vezes repete gestos e expressões, acho que pode encontrar mais nuances para enriquecer a cena.
Victor Maia traz uma cor que os outros personagens não emanam e nos dá esperança de que algum sorriso ingênuo, sem mágoas, pode surgir na casa dessa família. Em alguns momentos essa cor destoa demais da palheta dos Goodman. Mas pode ser proposital e eu é que estou sendo chato. E também posso não ter compreendido o André Dias. Eu adoro ele! Mas não consegui diferenciar os seus Dr. Finne e Dr. Madden.
Figurinos e cenários em perfeita harmonia com a cena, bravo. O som falhou em alguns momentos, mas por sorte não atrapalhou o espetáculo. A iluminação foi muito simples, de poucos tons. Eu senti falta de alguma coisa ali. Mas é um ponto de vista muito pessoal.
Bravo aos músicos e à toda a equipe por trás do espetáculo. É um número enorme de profissionais que trabalharam duro e essa dedicação fica clara quando o público levanta e aplaude de pé.
Chorei, refleti, saí de lá tão mexido que nem parei para dar um abraço na equipe do Mr. Zieg, a quem agradeço novamente pelo trabalho que o site faz. Parabéns.